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Segunda-feira, 9 de junho de 2025
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A crise de coesão da União Europeia e a dependência de uma narrativa militarista seriam os principais fatores que têm dificultado a definição de uma estratégia comum para o bloco nos últimos tempos. Esta é uma das reflexões trazidas pelo major-general Agostinho Costa, alto oficial do Exército português e mestre em Relações Internacionais, em entrevista exclusiva a Opera Mundi.

Agostinho também abordou temas como as tensões e conflitos globais, os riscos do revisionismo histórico, a relação entre Brasil e Portugal, e também a guerra na Ucrânia.

Segundo ele, é necessário fortalecer os laços bilaterais, pois Portugal é uma ponte fundamental para o Brasil na Europa, atuando como um “porta-aviões” na relação com o continente europeu.

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“Se analisarmos com alguma frieza, o grande impulso tecnológico que Portugal teve na última década foi com o Brasil, através da ligação à Embraer. Portugal funciona para o Brasil como o Reino Unido funciona para os Estados Unidos”, disse.

A respeito da crítica do presidente Lula, que classificou a atual corrida armamentista da Europa como “loucura”, Agostinho concorda ao enfatizar que a postura do Ocidente, liderado pelos dos europeus, é de uma “guerra perdida”, cujo objetivo não é vencer militarmente, mas enfraquecer a Rússia economicamente através de sanções que, na sua visão, são inúteis e até contraproducentes.

“A partir do momento que a indústria militar e de defesa europeia são geridas pela lógica neoliberal, do lucro, do ‘just in time’, da distribuição global das cadeias de produção, elas tornam-se completamente ineficientes. Diferente dos russos, que mantiveram a indústria do tempo soviético e a transformaram rapidamente numa economia de guerra. A Europa nunca conseguirá fazer isso”, reitera.

Guerra nuclear, Ucrânia e BRICS

Agostinha Costa não relutou em dizer que o mundo esteve sim à beira de uma guerra nuclear durante a istração Biden. Hoje, de acordo com ele, o risco maior estaria no Oriente Médio, caso o Benjamin Netanyahu “continue à solta”.

Sobre o futuro da guerra na Ucrânia, Costa acredita que o “evento midiático” em Istambul pode fracassar, resultando em um “congelamento” do conflito para manter uma tensão permanente naquela região, como uma espécie de nova “Cortina de Ferro”.

Com isso, a Cúpula do BRICS, no Rio de Janeiro, aria a ter uma importância maior no cenário internacional, representando a esperança de um mundo mais equilibrado.

“O Brasil é a cultura do século XXI, pois mostra que ideologias execráveis como a do conflito de civilizações, proposto por Samuel Huntington, são mentirosas. Só há uma civilização, que é a humana. E sim, é possível ter uma sociedade onde as pessoas tenham esperança, e isso é uma das grandes contribuições do Brasil que, em termos de recursos naturais, potencial econômico, científico, cultural e tecnológico, tem tudo para crescer. É uma das grandes economias do mundo”, analisou.

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Por fim, ao citar as eleições legislativas neste domingo (18/05), o major-general acredita que Portugal deve aproveitar a ligação direta com o Palácio do Planalto e os países africanos lusófonos na construção de uma política externa mais estratégica, abandonando a postura de “vassalo” no contexto da União Europeia. “Qualquer que seja o governo em Brasília, Portugal tem que estar ao lado”, sublinhou.

Confira os principais trechos da entrevista com o major-general Agostinho Costa a Opera Mundi:

Opera Mundi: A presença de Lula e de outros líderes do chamado ‘Sul Global’ no Dia da Vitória foi importante na luta contra o revisionismo histórico?

Major-general Agostinho Costa: Sim, foi muito importante para reforçar a memória histórica. Durante a Segunda Guerra Mundial, a União Soviética perdeu 27 milhões de civis e militares, e a China cerca de 20 milhões, números obscenos que não podem ser esquecidos. O revisionismo da história é, no mínimo, um insulto à consciência dos povos. Os países do Sul Global têm uma visão diferente, baseada em suas realidades. Não é a conjuntura atual que deve sobrepor-se ao respeito e à homenagem a esses homens e mulheres, militares e civis. Lula também representou o esforço de brasileiros que lutaram contra um regime que cercou cidades e construiu campos de concentração onde morreram não só judeus, mas ciganos, homossexuais, eslavos e todos aqueles que eram proscritos pela ideologia nazi, absolutamente execrável, e que, de uma vez por todas, deve ser recordada para nunca mais vir à superfície. Portanto, a ida de Lula fez justiça à história.

Qual é a real influência do presidente brasileiro em um possível cessar-fogo ou, até mesmo, num acordo de paz definitivo entre Rússia e Ucrânia?

A postura do presidente Lula e outros líderes como Modi, Ramaphosa e Xi Jinping é parar uma guerra considerada absurda. Lula faz parte dos estadistas que querem encerrar o conflito, pois reconhecem o alto custo de vidas ucranianas e russas e a falta de solução militar. A guerra poderia ter sido resolvida em março de 2022, também em Istambul. Lembremos que quando Olaf Scholz foi ao Brasil (em janeiro de 2023) pedir munições, Lula negou, reafirmando que o Brasil busca a paz. Sua postura é de genuíno compromisso com a resolução pacífica do conflito, se colocando, mais uma vez, ao lado certo da história. Já a liderança política da Ucrânia, incluindo Zelensky, não está no lado certo, pois poderia aceitar uma solução menos má para evitar a capitulação, como também sugeriu o ex-conselheiro do governo ucraniano Oleksiy Arestovych.

Se acabar com a guerra não é o objetivo, o que Zelensky e os líderes europeus procuram com essas negociações em Istambul?

Buscam transformar em uma armadilha para Putin, pressionando os norte-americanos a lançarem sanções severas, como as “Crash Bone”, para trazer os Estados Unidos de volta ao conflito e manter a guerra, enviando mais material e dinheiro para a Ucrânia. No terreno, os ucranianos enfrentam dificuldades, enquanto a União Europeia prioriza seus interesses estratégicos, mantendo sua coesão interna para impulsionar a economia e também reverter o Brexit, com Keir Starmer em um papel favorável. Essa estratégia visa manter o status quo político. Mas há aqui um pormenor, um fator disruptivo, que é o fato de os russos estarem interessados numa relação de aproximação com os norte-americanos, já que Trump não está muito disposto a implementar o conjunto de sanções imposto no Senado e no Congresso, que são os tais 500% para quem comprar petróleo e gás na Rússia, quando o principal cliente é a China. Ou seja, a divergência entre europeus, Zelensky, norte-americanos e russos mostra complexidade. A cúpula em Istambul pode ser só um evento midiático, sem resultados concretos, enquanto a guerra persiste e o povo ucraniano sofre com os avanços russos.

Ainda em Moscou, Lula disse que a corrida armamentista na Europa é “uma loucura”. Concorda com essa afirmação?

Em absoluto. Ainda há bastante relevância na questão do armamento porque a Europa não tem recursos, mas esse discurso é para espantar os mais incautos. Veja, a Alemanha tem uma população de 80 milhões. O exército alemão é composto por 73 mil homens e mulheres. Como será o mais forte da Europa? A Polônia também diz o mesmo. Esta gente odeia uns aos outros. Os polacos odeiam os russos, não sei se odeiam mais, ou menos, ou na mesma medida os alemães. Até porque eles já os dividiram três vezes. E as divisões a partir da Polônia têm sido entre a Alemanha e a Rússia. A França não se esquece de ver os nazis a desfilarem nos Campos Elíseos. Os britânicos olham para a Europa sempre com desconfiança na política da apelação do poder. Com os espanhóis, é uma coisa um bocado estranha, mas já não conta muito. Os italianos nem querem nada com a Europa agora. Giorgia Meloni está a olhar para o lado de lá do Atlântico. Aqui na Europa, ninguém se entende.

Então, qual é o problema da Europa neste momento?

É a coesão europeia. O projeto europeu de paz e desenvolvimento que emergiu na sequência da barbaridade da Segunda Guerra, parece não existir. Hoje, a União Europeia só fala numa coisa: na guerra da Ucrânia. E quanto mais fala, mais os cidadãos vão se separar e considerar a União Europeia inútil, principalmente quando vêm desbaratar bilhões de euros em um país que é considerado pelo próprio Marco Rubio como um dos mais corruptos do mundo. As declarações de Merz sobre a Alemanha ter o maior exército da Europa valem pouco, ou quase nada. Até porque para os cidadãos falta uma ideologia mobilizadora, e dizer que os russos vêm por aí, não é uma ideologia como o nazismo, que mesmo sendo extrema-direita pura e dura, é capaz de mobilizar as massas.

E neste momento, qual ideologia é que têm para usar?

A neoliberal. Falta um plano social, econômico e biológico, pois a Europa é um deserto de ideias. Só dizer que os russos são uma ameaça não é suficiente para mobilizar uma população para a guerra, como se tem visto. E depois, com o agravante, criaram as sementes da sua própria insolvência. A partir do momento que a indústria militar e de defesa é gerida pela lógica neoliberal, que é a lógica do lucro, do just in time, da distribuição global das cadeias de produção, ela torna-se completamente ineficiente. Diferente dos russos, que mantiveram a indústria do tempo soviético, transformando-a rapidamente numa economia de guerra. A Europa nunca conseguirá fazer isso. A Porsche disse que vai fazer carros de combate. Isso é tudo retórica, não a declarações no vazio. Por isso que se vê, insistentemente, discursos sobre o retorno ao serviço militar obrigatório. Porque não há voluntários para as Forças Armadas, é um deserto. E não é só aqui, nos Estados Unidos também.

Major-general Agostinho Costa concordou com declaração de Lula, que classificou atual corrida armamentista da Europa como ‘loucura’
Reprodução vídeo / CNN Portugal

A declaração de Macron sobre não poder mais fornecer apoio militar à Ucrânia é uma forma de itir a vitória de Putin?

Faz 11 meses que tivemos a chamada ‘Cúpula da Paz’, uma reunião da Ucrânia com seus patronos ocidentais no sentido de impor uma capitulação à Rússia. A verdade é que não querem paz nenhuma. O que eles querem são 30 dias para colocar uma presença militar na Ucrânia por diversos países, incluindo França, Inglaterra, Alemanha e aliados, com o objetivo de ocupar e estabelecer influência, similar às ações na Coreia e na Alemanha Ocidental após a Segunda Guerra Mundial, numa espécie de nova ‘Cortina de Ferro’. Outra coisa importante que o Macron disse foi o fato de não haver um exército dimensionado para guerras de alta intensidade na Europa. Por isso que os holandeses venderam os carros de combate. Os Estados Unidos, que andaram 20 anos como polícia do mundo, com o discurso fantasioso de guerra contra o terrorismo, também sabe disso. O terrorismo é uma realidade, um fato, uma preocupação, mas sabemos quem é que o fomenta, não é? Estamos vendo na Síria alguém que, há poucos dias atrás tinha a cabeça a prêmio por 10 milhões de dólares, e se tornou um presidente não eleito. Os mesmos que derrubaram abaixo as Torres Gêmeas. As mais de 3 mil pessoas que morreram no 11 de Setembro devem estar aos saltos, às voltas do túmulo, pois foi esta gente quem os destruiu. É nisso que dá fazer pactos com o diabo.

Você vislumbra, num futuro próximo, o envio de tropas portuguesas para a Ucrânia?

Isso é demagogia. Não creio que haja esse tipo de intervenção da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em breve, pois os Estados Unidos evitam enviar forças na Ucrânia por causa do artigo quinto do Tratado de Washington, que é uma linha vermelha para a Rússia. Continuar a falar em força de interposição é uma fantasia. Se olharmos bem, os contributos de Portugal são proporcionais à dimensão das suas forças armadas. Uma coisa é a percepção das elites, outra coisa é a percepção dos cidadãos. E cada vez estamos mais convencidos que as elites europeias não gostam dos europeus, e que as elites portuguesas não gostam dos portugueses. A capacidade de projeção de forças portuguesas é irrelevante. Um exemplo é a presença do país em missões como a enviada à República Centro-Africana. Originalmente, a intervenção portuguesa na África Central foi motivada por interesses de agradar aliados ses e garantir apoios políticos, como a eleição de António Guterres à liderança das Nações Unidas. Naquela época, Portugal enviou forças para apoiar a Operação Barkhane, uma iniciativa sa no Sahel, visando combater o terrorismo na região. Hoje, o cenário mudou drasticamente: a França foi praticamente expulsa de países como Níger, Burkina Faso e Mali, enquanto a República Centro-Africana permanece um foco de atuação portuguesa. Por isso, Portugal deve reconsiderar sua relação com o BRICS e sua estratégia geopolítica.

Caso não saia um acordo efetivo em Istambul, a próxima Cúpula do BRICS ganha uma importância maior no cenário geopolítico e na busca pela paz?

O BRICS é, neste momento, o grupo mais importante no plano global, é a esperança de um mundo melhor, é algo inovador. No BRICS, não há uma locomotiva, isto é, não há um comandante. É uma associação de países que se respeitam nas suas diferenças, nas suas identidades, e não há um diretório, não há um país que manda e os outros obedecem. Fundamentalmente, são países onde está a centralidade estratégica e econômica. O Brasil é a cultura do século XXI, pois mostra que ideologias execráveis como a do conflito das civilizações, proposto por Samuel Huntington, são mentirosas. Só há uma civilização, que é a humana. E sim, é possível ter uma sociedade onde as pessoas tenham esperança, e isso é uma das grandes contribuições do Brasil que, em termos de recursos naturais, potencial econômico, científico, cultural e tecnológico, tem tudo para crescer. É uma das grandes economias do mundo. Em 2024, os indicadores do Fundo Monetário Internacional (FMI) mostraram que, entre os países do G7, os Estados Unidos são os únicos com crescimento acima de 1,5%, enquanto a Alemanha enfrenta recessão com menos de 0,2% de crescimento. Como é que este país quer ter o maior exército da Europa? Não tem. E toda essa ação de tarifas é uma mostra de que os Estados Unidos estão tentando salvar uma economia que tem 36 trilhões de dólares em dívidas.

Estamos realmente à beira de uma guerra nuclear?

Estivemos perto, quando Starmer foi a Washington pedir autorização para lançar Storm Shadows sobre o interior da Rússia. Biden ainda tinha medo de uma guerra nuclear e disse que não. Mas depois que Biden e os Democratas perderam as eleições, tendo em conta o estado de distúrbio cognitivo em que o ex-presidente estava, não sabíamos ao certo quem é que controlava o botão nuclear nos Estados Unidos. Era Sullivan? Biden? Blinken? Lembremos ainda de quando os americanos, ingleses e ses começaram a lançar Storm Shadow, Scalps e ATACMS dentro do território russo, e quando a Ucrânia atacou um dos radares da defesa nuclear russa com empenhamento do Ocidente. A guerra nuclear só não se concretizou porque Putin é alguém com algum sangue frio, e percebeu que o relógio não pára e o melhor era esperar. Além do mais, a Rússia tem abatido mísseis com dispositivos eletrônicos e o sistema S-400. Neste momento, a probabilidade de uma guerra nuclear é muito menor. O risco maior estaria no Oriente Médio, caso Benjamin Netanyahu continue à solta. Mas já vimos que nos últimos dias, com as ações de Trump, ele deve estar com as orelhas muito quentes, porque a coisa não está a correr nada bem. Aliás, a última medida de levantar as sanções contra a Síria foi feita sem a aprovação do primeiro-ministro israelense. A negociação direta com o Hamas para a libertação de um refém estadunidense também foi realizada à revelia de Israel.

O que muda a postura em relação ao governo Biden.

Mudou completamente! É um giro de 180 graus, uma inversão total. Quando Biden saiu, nós viemos a saber que, cada vez que o falcão Anthony Blinken ia ao Oriente Médio, era para piorar a situação, para colocar água na fervura, como se diz aqui em Portugal. Netanyahu teve carta branca durante o governo Biden. Trump não é tão pouco dotado de inteligência quanto dizem, é naturalmente uma figura quixotesca, mas, qual é o presidente que não é quixotesco? Basta olhar para Bush e Reagan, por exemplo. Tradicionalmente os presidentes são performers. Como sabemos, muitos deles vêm do teatro ou da comédia, porque é o deep state norte-americano que define. O problema neste momento nos Estados Unidos é que há uma divisão profunda entre aqueles que julgo estarem em 1992, na América do Fukuyama, no ‘fim da História’, e outros que já perceberam que isso não existe.

Quando os temas são os conflitos, António Guterres tem sido mais combativo do que António Costa. Como avalia a presidência do Conselho Europeu até o momento?

António Costa não teve e nem terá tempo para margem de manobra, sendo ofuscado por Ursula von der Leyen, que mesmo enfrentando problemas com a justiça por causa dos SMS trocados com a Pfizer, é quem continua a mandar. Embora seja um bom negociador, Costa é fraco em estratégia, como demonstrado em seu último governo, que foi diferente do anterior, conhecido como ‘Geringonça’, que tinha personalidades mais relevantes. Na União Europeia, não há uma visão clara para o futuro, especialmente em relação à China e ao endurecimento do discurso europeu. A União Europeia ainda se recupera do trauma da derrota de Kamala Harris, mantendo uma postura de vassalagem aos Estados Unidos. Portugal, embora historicamente europeísta, esperava uma Europa de fronteiras abertas e identidades regionais, com ideais iluministas que, infelizmente, parecem estar desaparecendo. O último estadista europeu com esses princípios morreu há alguns dias: o Papa Francisco.

E como resolver o problema em Portugal?

Ter uma política externa e estratégia de segurança nacional definidas. Como já dizia o professor Adriano Moreira, Portugal desperdiça aquilo que é o seu principal capital: a ligação com Brasília e Luanda. No contexto da União Europeia, é um país vassalo, secundário, menor e sem interesse. No contexto da relação com os Estados Unidos, tem que ser boa, porque temos uma fronteira marítima com eles. Não queremos que em a tratar os Açores como tratam a Groenlândia, não é? Para Portugal ter relevância no contexto internacional e ser um país exógeno, mas não exíguo, é preciso ter uma ligação direta ao Brasil, ao Palácio do Planalto. Qualquer que seja o governo em Brasília, Portugal tem que estar ao lado do Brasil.

Os dois partidos que lideram a corrida eleitoral em Portugal exaltam a União Europeia e apoiam a Ucrânia. Acredita ser possível uma aproximação com Brasil e Angola depois de 18 de maio?

Sinceramente, não há diferença entre a Aliança Democrática (AD) e o Partido Socialista (PS). O que falta em Portugal não são políticos, são think-tanks, pensamentos estratégicos, estruturados. É a interação entre a sociedade civil brasileira e portuguesa, portuguesa e angolana, porque é ela quem domina o processo. Se analisarmos com alguma frieza, o grande impulso tecnológico que Portugal teve na última década foi com o Brasil através da ligação à Embraer. E essa relação é importante para Brasília porque assegura na Europa um ponto de apoio. Portugal funciona para o Brasil como o Reino Unido funciona para os Estados Unidos. É o seu porta-aviões na Europa. E esse é um dos mercados mais importantes no mundo. Nós somos uma porta para o Brasil, que tem a dimensão demográfica que nos falta. Portugal, segundo as estatísticas divulgadas neste mês pelas Nações Unidas, vai perder, no mínimo, dois milhões de habitantes, ou mais, até o final do século. Basta 1% da população brasileira deslocar-se para que a nossa população triplique. A ligação à língua e à cultura brasileira são fortes, e o brasileiro é muito mais alegre que o português, que é um simbólico, um triste. O Brasil teve a vantagem de não ter uma inquisição.

Mas nós fomos vítimas dela.

Sim, os portugueses mandavam lá os inspectores, mas nunca houve uma inquisição sediada na Bahia ou no Rio, e isso foi o equilíbrio. O brasileiro é muito mais livre, tem uma relação com o corpo, a natureza e a vida muito mais desprendida do que os portugueses, que são recalcados e que tiveram 300 anos de inquisição. Por isso os cristãos novos foram para o Brasil, porque lá estavam à vontade. Outra vantagem foi ter uma relação com Angola. A alegria, a criatividade, o calor e a heterologia dos africanos faz um povo diferente. Angola e Brasil controlam o Atlântico Sul, que é lusófono. E este vértice Angola, Brasil e Portugal, pode fazer a diferença. No fim desta guerra na Ucrânia, o mundo vai mudar. A OTAN, provavelmente, será uma organização irrelevante. Pelo menos a prazo, porque é a grande derrotada. E, sem dúvidas, o Ocidente também sairá derrotado. Quem ganha são os países do BRICS e a Rússia, que teve um salto tecnológico graças ao apoio fundamental que recebe da China.