Trump, crise e derrotismo
Como Trump demonstra, a disseminação do medo é uma das melhores ferramentas que a burguesia fascista tem para impor seu poder político
A disseminação do medo é uma das melhores ferramentas que a burguesia fascista tem para impor seu poder político. Por vários motivos, mas principalmente porque o terror é eficaz em criar paralisia. Por medo de sofrer um assalto, as pessoas evitam sair de casa a noite; com receio da violência policial, recomenda-se que os jovens não participem de manifestações; é pelo medo da retaliação que se pensa duas vezes antes de levantar a voz contra uma injustiça no trabalho; dizem que é por medo de não conseguir aprovar seus projetos que o governo não está enfrentando a direita e o Centrão no Congresso Nacional.
Desse ponto de vista, a ofensiva após a vitória eleitoral de Donald Trump certamente tem como um de seus objetivos afirmar a dominação do império norte-americano para impor medo ao mundo, com medidas que, além de bastante radicais, estão sendo decretadas sem vacilações, como quem diz ser o todo-poderoso, o implacável, o imperador.

(Foto: Daniel Torok / White House)
Quem manda são os ricaços
A fotografia da posse de Trump ao lado dos magnatas da Amazon, Google, Meta, Apple, X e até da chinesa Tiktok mostra o compromisso deste segundo mandato: servir aos interesses dos homens mais ricos e alguns dos principais expoentes da burguesia mundial.
Exemplo disso é que o nazista Elon Musk, patrocinador bastante generoso da campanha de Trump, será o novo conselheiro do presidente, com a criação do Departamento de Eficiência Governamental (DOGE), que tem como objetivo, nas suas palavras, “expor o desperdício insano e a corrupção governamental”. De fato, Musk fez um ótimo investimento e agora está muito bem localizado para beneficiar os negócios das suas empresas com o Estado.
Vale observar que as taxações têm como alvo as mercadorias e matéria-prima de países dependentes, uma tática para forçar negociação de políticas anti-imigratórias e outras ações xenofóbicas, além de aumentar o protecionismo da indústria interna, ao mesmo tempo que impõe maior tensão com outros imperialistas. É a radicalidade do fascismo colocando a casa em ordem para as gigantes estadunidenses.
Falsa saída para a crise
Trump está transformando o seu conhecido discurso nazista, racista, misógino e homofóbico em medidas concretas com a política de guerra, os decretos anti-imigrantes e a caça aos direitos sociais.
Mas da mesma forma que a bravata fascista não é novidade, as verdades que tenta esconder também não são. O fato é que se faz necessário eleger responsáveis pela crise econômica, social e moral dos EUA, ao mesmo tempo em que se afirma na disputa pela hegemonia mundial.
E que baita crise! O salário mínimo no país é um verdadeiro salário de fome e estudo do Bank do America Institute mostra que 30% das famílias gastam cerca de 95% da renda mensal em moradia e alimentação; além disso, em 2024 existiam 771.480 norte-americanos em situação de rua, sendo 150 mil crianças e adolescentes.
A revolta cresce e crescem também os choques de classe. Greves em gigantes como Amazon e Starbucks estouraram no último ano. Em outubro, os operários portuários cruzaram os braços e conquistaram 62% de aumento salarial, seguindo o exemplo dos 350 mil trabalhadores da indústria automobilística que no ano anterior paralisaram durante três meses.
Em 1935, no 7º Congresso da Internacional Comunista, um comunista búlgaro chamado Georgi Dimitrov pronunciou o histórico discurso “Unidade Operária Contra o Fascismo”, onde previa a aproximação da guerra mundial e alertava: “o fascismo consegue atrair para si as massas, porque apela de forma demagógica para suas necessidades e exigências mais candentes. O fascismo não só instiga os preconceitos profundamente arraigados nas massas, como especula também com os melhores sentimentos destas, com sua sede de justiça […]”
Responsabilizar imigrantes e LGBTs pela frustração americana é uma questão de sobrevivência. Fica evidente que a vitória de Trump é a necessidade histórica de um sistema caduco, respirando por aparelhos, mas bastante feroz.
O imperialismo não é invencível
Mas esse clima de medo não depende só do agressor: o derrotismo que impera nas análises de parte da esquerda contribui diretamente para o imobilismo. Para eles, a ordem é não enfurecer o invencível Trump. O que está por trás desse discurso é a mesma lógica que desmobilizou os atos por prisão de Bolsonaro e os generais golpistas que aconteceriam em 8 de janeiro deste ano para não provocar os militares. Alegando que está muito difícil mobilizar a classe trabalhadora, conduzem o movimento para o pântano.
Enquanto isso, a direita está convocando novos atos golpistas para março. Ou seja, do lado de lá eles mantêm a ofensiva.
Por isso, acredito que o caminho é espelhar nossas ações naquilo que mobiliza os combatentes da resistência Palestina: consciência sobre os limites eminentes do imperialismo capitalista e da consequente força do povo que luta. É preciso sair debaixo da cama e ir ao trabalho, aumentar a organização popular, canalizando a revolta contra as injustiças e dificuldades da vida para fortalecer a via revolucionária. Caso contrário, deixaremos as ruas para a direita, mais uma vez. Sem suor e sem trabalho, nenhuma obra se completa.
