Califórnia anuncia processo contra Trump por ‘uso ilegal’ da Guarda Nacional
Manifestantes contrários às políticas imigratórias do governo foram reprimidos em Los Angeles; dois jornalistas ficaram feridos
O governador da Califórnia, Gavin Newsom, informou nesta segunda-feira (09/06) que seu estado processará o governo de Donald Trump pelo envio da Guarda Nacional (Forças Armadas dos Estados Unidos) para reprimir os protestos pró-imigrantes que ocorreram no último final de semana.
“Era exatamente isso que Donald Trump queria. Ele atiçou os incêndios e agiu ilegalmente para federalizar a Guarda Nacional. A ordem que ele assinou não se aplica apenas à Califórnia. Isso permitirá que ele vá a qualquer estado e faça a mesma coisa. Vamos processá-lo”, escreveu em uma publicação da rede social X.
This is exactly what Donald Trump wanted.
He flamed the fires and illegally acted to federalize the National Guard.
The order he signed doesn’t just apply to CA.
It will allow him to go into ANY STATE and do the same thing.
We’re suing him.pic.twitter.com/O3RAGlp2zo
— Gavin Newsom (@GavinNewsom) June 9, 2025
Em entrevista concedida à Fox News na noite do último domingo (08/06) e publicada na madrugada desta segunda-feira, o governador democrata disse que o presidente norte-americano é “imprudente” e “imoral” por ter adotado o “ato ilegal e inconstitucional de federalizar a Guarda Nacional”.
Newsom resgatou a ordem executiva assinada pelo próprio republicano sobre a instrução para o Departamento de Defesa colaborar com os governadores estaduais, e denunciou: “não houve colaboração. Não houve conselho, nem consideração das regras de engajamento. Foi um ato imprudente que levou a condições que se exacerbaram e está colocando a vida das pessoas em risco”.
Por isso, “há um motivo para irmos ao tribunal amanhã [nesta segunda-feira] e estamos confiantes de que teremos sucesso”, declarou, complementando que, como governador da Califórnia, é “seu trabalho limpar a bagunça” deixada por Trump.
A autoridade disse ainda que apesar das cenas de desordem, como carros queimando e rodovias fechadas, “as coisas estão totalmente sob controle no momento”, mas reiterou que Trump “exacerbou as condições” e que essas imagens foram “criadas” por ele.
“Ele tem objetivos políticos. Ele quer nos dividir e atacar o estado de direito. Ele quer atacar a democracia. Ele está testando os limites da Constituição de uma forma que se pode claramente argumentar como uma crise constitucional”, adicionou.
Newsom disse ainda recorrer à Justiça porque “ninguém pode” negociar com o governo Trump. “Eu tento, eu me esforcei muito para tentar trabalhar com esse cara. Não é possível trabalhar com ele. Você só pode trabalhar para ele e eu nunca trabalharei para ele”.
“Ele não está aqui para fazer a paz. Ele está aqui para a guerra. Ele quer uma guerra civil nas ruas dos Estados Unidos e está testando os limites ao nacionalizar a Guarda Nacional”, concluiu.
As declarações do governador ocorrem logo após uma solicitação formal para que a istração Trump “rescindisse o envio ilegal de tropas ao condado de Los Angeles”.
“Não tínhamos problemas até Trump se envolver. Isso é uma violação grave da soberania do Estado — inflamar tensões e, ao mesmo tempo, desviar recursos de onde são realmente necessários. Revogue a ordem. Devolva o controle para a Califórnia”, instou Newson.
I have formally requested the Trump istration rescind their unlawful deployment of troops in Los Angeles county and return them to my command.
We didn’t have a problem until Trump got involved. This is a serious breach of state sovereignty — inflaming tensions while… pic.twitter.com/SYIy81SZdH
— Governor Gavin Newsom (@CAgovernor) June 8, 2025
A prefeita de Los Angeles, Karen Bass, também democrata, disse que a presença da Guarda Nacional gerou um “caos intencional” na cidade. “Parece que as tropas foram mobilizadas de maneira provocatória”, salientou.
A Casa Branca respondeu às declarações do governador democrata. Por meio da porta-voz Karoline Leavitt, o governo Trump acusou Newsom de “não fazer nada enquanto violentos tumultos eclodiram em Los Angeles por dias”.

U.S. Northern Command/X
“Policiais federais foram atacados por radicais violentos e criminosos ilegais agitando bandeiras estrangeiras porque o governador Newsom era fraco demais para proteger a cidade”, referindo-se aos manifestantes pró-imigrantes.
Leavitt concluiu dizendo que “o presidente Trump interveio para manter a lei e a ordem e proteger os edifícios federais”.
Em outra publicação, a representante do governo Trump usou da foto de um manifestante segurando a bandeira do México para dizer que “os tumultos em Los Angeles provam que precisamos desesperadamente de mais pessoal e recursos de fiscalização da imigração”.
“Os Estados Unidos devem reverter a invasão desencadeada por Joe Biden de milhões de imigrantes ilegais sem controle em nosso país. É por isso que o Projeto de Lei do presidente Trump financia pelo menos um milhão de remoções anuais e contrata 10.000 novos agentes do ICE, 5.000 novos agentes da alfândega e 3.000 novos agentes da Patrulha da Fronteira”, advertiu.
The riots in Los Angeles prove that we desperately need more immigration enforcement personnel and resources.
America must reverse the invasion unleashed by Joe Biden of millions of unvetted illegal aliens into our country.
That’s why President Trump’s One Big, Beautiful Bill… pic.twitter.com/8VoZHPqYgC
— Karoline Leavitt (@PressSec) June 9, 2025
Ilegalidade
A revista norte-americana Time publicou um artigo contextualizando a ilegalidade do ato de Trump em convocar a Guarda Nacional para atuar na Califórnia.
“Para mobilizar a Guarda Nacional, Trump invocou o Título 10, Seção 12406 do Código dos EUA, que permite a federalização da Guarda Nacional em casos de invasão ou rebelião, ou se o presidente não for capaz de executar as leis do país com “forças regulares”, menciona a publicação.
Contudo, a Seção também menciona que “ordens para esses propósitos devem ser emitidas pelos governadores dos estados”. Ou seja, a medida deveria ser solicitada por Newsom, o que não foi feito.
A Time ainda resgata uma lei de 1878, a Lei Posse Comitatus, que” limita o uso de militares federais para a aplicação da lei civil nos EUA, o que significa que em Los Angeles as forças da Guarda Nacional mobilizadas por Trump podem proteger agentes federais, como autoridades do ICE, e propriedades federais, como centros de detenção, mas não podem prender manifestantes”.
Repressão
Dezenas de pessoas foram presas durante protestos, que estão em seu terceiro dia, na Califórnia contra as políticas anti-imigrantes de Trump. A polícia local confirmou pelo menos 60 detenções em São Francisco e outras 27 no centro de Los Angeles.
Lar de uma das maiores comunidades latinas dos EUA, a metrópole tem sido palco de protestos contra as medidas anti-imigrantes do governo Trump. Durante as manifestações do último fim de semana, houve confrontos com a polícia, que utilizou gás lacrimogêneo e balas de borracha, deixando diversos feridos, incluindo o fotojornalista britânico Nick Stern e a jornalista australiana Lauren Tomasi, atingida com um tiro por um agente enquanto fazia uma transmissão ao vivo.
A agência italiana ANSA também constatou que soldados da Guarda Nacional dispararam balas de borracha na altura dos olhos e nas pernas de manifestantes em Los Angeles no domingo (08/06);
Já Trump ordenou que todos os indivíduos mascarados fossem presos, enquanto o secretário de Defesa dos EUA, Pete Hegseth, acenou com a possibilidade de enviar 500 fuzileiros navais da Marinha para Los Angeles.
A presidente do México, Claudia Sheinbaum, reagiu à repressão contra os protestos e disse que os fluxos de imigrantes “não deveriam ser enfrentados com ataques e violência”. “Não estamos de acordo com essa maneira de tratar o fenômeno migratório”, declarou.
(*) Com Ansa e informações de The Guardian
