Palestina que inspirou nome de embarcação humanitária diz que ativistas tiveram atitude nobre
Pescadora Madleen Kulab diz que missão da Flotilha causou grande repercussão na mídia internacional
“Eu esperava fortemente por esse cenário, mas realmente esperava por um milagre: de alguma forma, o navio romperia o bloqueio e chegaria a Gaza”. Esse é o relato de Madleen Kulab, pescadora de 30 anos que inspirou o nome do navio que tentou levar ajuda humanitária ao enclave palestino, mas acabou sendo interceptado pelas forças de Israel.
Em entrevista à emissora catari Al Jazeera, enquanto acompanhava a jornada da embarcação com uma mistura de esperança e ansiedade, a palestina disse que se entusiasmou com os reportes enviados pelo barco que levava o seu nome, e que permaneceu em contato próximo com os organizadores da Coalizão da Flotilha da Liberdade (FFC, na sigla em inglês) até o último domingo (08/06).
Mas seu otimismo deu lugar à tristeza após a captura da embarcação. “Fiquei profundamente desanimada”, disse Kulab, sobre a a notícia de que as forças israelenses interceptaram o navio em águas internacionais e detido as 12 pessoas a bordo, incluindo a ativista climática sueca Greta Thunberg e o brasileiro Thiago Ávila.
Na noite anterior à interceptação do navio, a pescadora conversou com Rima Hassan, deputada sa do Parlamento Europeu que estava a bordo.
Hassan, de origem palestina, disse a Kulab por videochamada que seu maior sonho era visitar Gaza. “E, no entanto, esse sonho simples [de visitar Gaza] foi tornado impossível por Israel”.
Para a pescadora, a interceptação agravou o peso do isolamento de viver sob o bombardeio de Israel. “Vivemos em um lugar completamente isolado do mundo. [Desde 2010] todas as tentativas anteriores das flotilhas de romper o bloqueio foram recebidas com intervenção militar”, disse Kulab, referindo-se a como missões anteriores foram bloqueadas ou atacadas por forças israelenses.
Desde que sua última guerra em Gaza começou em 7 de outubro de 2023, Israel matou pelo menos 54.880 palestinos e feriu 126.227, de acordo com o Ministério da Saúde de Gaza. E, desde 2007, os palestinos em Gaza vivem sob um bloqueio aéreo, terrestre e marítimo imposto por Israel. “A história deste navio reflete a minha e a história de todas as pessoas cansadas e esgotadas em Gaza”, disse ela.
Para Kulab, a repercussão na mídia internacional da missão da Flotilha e a interceptação do navio refletem o sofrimento mais amplo dos palestinos em Gaza, que ela diz parecer interminável. “Somos apenas uma onda da mídia: ela surge abruptamente, depois desaparece com a mesma rapidez, e somos deixados para enfrentar nossa dor em silêncio”.

Instagram / @madleenkulab
Repercussão
Com a detenção dos tripulantes do Madleen, Kulab disse que só espera pela segurança deles e seu eventual retorno para casa. Thunberg foi deportada de Israel na terça-feira (10/06). “A nobre mensagem deles foi transmitida: a mensagem da humanidade chegou ao mundo”, disse ela.
A população de Gaza está enfrentando fome e, depois que Israel suspendeu parcialmente seu rigoroso cerco em maio, centros de ajuda humanitária se tornaram alvos de assassinatos, com soldados israelenses e agentes de segurança dos Estados Unidos atacando multidões de palestinos que tentavam ter o a alimentos.
Dia após dia, a vida se torna mais inável, disse a primeira pescadora de Gaza. “Estou me afogando em sofrimento em meio à guerra e à fome, assim como a minha família e todos por aqui”, lamentou Kulab.
Quem é Madleen Kulab
Madleen Kulab é a única pescadora em Gaza, além de ser a única nadadora de resgate certificada. Ela pesca com o pai desde os seis anos de idade e, aos 12, já saía sozinha.
“Fiquei profundamente comovida. Senti uma enorme sensação de responsabilidade e um pouco de orgulho”, contou a Al Jazeera quando um amigo ativista irlandês lhe disse que o navio que tentaria quebrar o bloqueio em Gaza receberia seu nome.
Quando a guerra de Israel em Gaza começou, sua família ficou devastada e, depois, desolada quando as forças israelenses mataram o pai de Madleen em um ataque aéreo perto de sua casa em novembro de 2023.
Ao lado do marido, Khader Bakr, de 32 anos e também pescador, eles fugiram com três filhos para Khan Younis, Madleen grávida de quase nove meses. Depois, seguiram para Rafah, para Deir el-Balah e finalmente para Nuseirat.
Agora, sua família está de volta ao que restou de sua casa na Cidade de Gaza, um espaço gravemente danificado para onde regressaram quando o exército israelense permitiu que os deslocados retornassem ao norte em janeiro.
Atualmente, Madleen e Khader não podem mais pescar, porque Israel destruiu seus barcos e um depósito inteiro de equipamentos de pesca durante a guerra.
